terça-feira, 29 de julho de 2014

Nenhum lugar é perfeito quando não estamos em casa

A Mariana é minha amiga há 18 anos. É daquelas amigas com quem podemos não falar durante algum tempo, mas quando estamos juntas é como se estivéssemos falado no dia anterior. A Mariana é uma Mulher com M grande, cheia de força, coragem e garra. Lutou contra as adversidades da vida de uma forma arrebatadora, que nos deixou a todos desarmados. Tem um olhar cativante, um sentido de humor estupidamente apurado e um sorriso imaculado.
Já foi repórter da SIC, depois de decidir que afinal não queria ser advogada. Hoje está em Bruxelas a seguir um sonho antigo. Faz parte da equipa de porta-vozes do Presidente da Comissão Europeia. Tem saudades de casa, é certo. Mas teve a coragem de trocar tudo isso pelo incerto. É um exemplo de vida, uma fonte de inspiração.
Escreveu-nos um texto sobre o que é viver no estrangeiro nos dias de hoje, de nos encher a alma e o coração. Hoje, é a Mariana quem nos vai falar com paixão:

"Bruxelas não é amor à primeira vista…nem à segunda…mas quando menos esperamos está lá. É preciso dar segundas e terceiras oportunidades para nos começarmos a sentir "em casa". Estar longe da família e dos amigos não facilita o processo de integração (mesmo para alguém que como eu adora os "outros", os cheiros, as coisas, as diferentes culturas e formas de estar) mas quando ultrapassamos esta fase, damos por nós mais fortes e resistentes às intempéries da vida …e do tempo, sim, porque aqui chove 10 meses por ano e na maior parte dos dias…não há sol. Sou uma rapariga do Norte, habituada a algumas surpresas da meteorologia mas mesmo assim os nevoeiros que nos surpreendem nas manhãs de verão ou as chuvas tardias em Abril que temos no Porto, não se comparam às nuvens escuras que por cá andam ainda em Julho ou aos 11 graus em alguns dias de verão! Mas não pensem que isto nos impede de viver! Para combater a "depressão" do mau tempo… saímos (muito), socializamos (muito) e viajamos (mais).

Geograficamente Bruxelas tem uma localização preferencial em relação a grande parte dos países europeus, e para mim passar fronteiras é uma forma de reciclar a mente e a alma. Encravada no meio de alguns dos países mais poderosos do mundo, a pequena Bélgica fez – se grande quando se tornou a…capital da Europa… e a capital da Europa faz fronteira com 4 países – Holanda, França, Alemanha e Luxemburgo (podemos acrescentar Inglaterra também, uma vez que entre eles só há o canal da mancha ) Exemplo: duas horas de comboio et voilá, estamos em Londres e não é exagero quando digo que podemos ir almoçar a Paris (1h20m de comboio).
No entanto há coisas aqui de que não gosto mesmo: o lixo nas ruas, a pobreza explícita daqueles que vêm tentar a sua sorte no coração da Europa, as obras que demoram anos a ser concluídas e o trânsito infernal. Também não gosto nada do amontoado de edifícios das instituições europeias. Faz-me pensar que Bruxelas não é mais do que um open space onde toda a gente parece querer trabalhar…mas sim , podem acreditar, a cidade é muito mais do que isso. Turística QB, as atrações passam muito pela cerveja, pelos grandes parques e pelo centro da cidade. Só quando perdemos algum tempo a fazer passeios a pé é que nos lembramos que há realmente coisas que valem mesmo a pena ver… culpa do trabalho de escritório que nos consome os dias e que nos escurece os horizontes, não deixando espaço para nos lembrarmos que há mais vida para além da bolha em que vivemos. Uma bolha onde ainda se luta pela igualdade de género, onde os homens são mais do que nós e onde nem sempre é fácil ser mulher… temos de ser em tudo MAIS: Mais inteligentes, mais atentas, mais desconfiadas, mais cautelosas, mais formais…uffff, cansa, especialmente porque nos tornamos menos nós.
Apesar de tudo a vida em Bruxelas tem sido boa, tornou-se um amor construído pelas amizades feitas, pelo saber adquirido, pelas experiências vividas, mas a quem eu quis dar um prazo de validade. Há alturas assim. Perdi a cabeça e escolhi a aventura em prejuízo da estabilidade. Estou de malas feitas, em Janeiro mudo-me para Londres, mas sempre com a certeza de que nenhum lugar é perfeito quando não estamos em casa."
 

Obrigada Mariana, por seres assim.
Keep going!
E força a todos aqueles que vivem longe de casa e que trabalham arduamente por uma vida melhor!

2 comentários:

  1. Sempre que viajo, ao regressar sinto-me feliz. Sinto-me em casa. Não há nada como a nossa casa, a nossa terra.

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  2. texto tão real..vivi um ano em bruxelas e sim, é amor à 5a/6a vista.... mas há muito mais que move aos "emigras", e tenta-se superar tudo :)

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